28.2.13

Pára Deus

A vontade do adeus! Adeus!
Ao Deus, digo foda-se. Duvido você existir!
Du-vi-do! - risos

Duvido você me anular, extinguir-me,expulsar-me da memória alheia
e fazer com que todos jamais saibam quem eu fui.
Consegue?
Há! 

Tem alguém surdo ai??? Ca-cete!
Esse cara não conversa com niguém que não tenha bata-e-ezquizofrenia?
Hei! Tô aqui!

Desafio você a fazer tudo isto !
Tudo isto enquanto Eu vivo! 

Fazer com que todos me esqueçam e que eu viva o meu próprio esquecimento – E em vida!

Ah! E não quero que me expurgue 
para dar de exemplos aos outros.. Isso é golpe baixo.
Isso não vale... Seja justo ao menos comigo...

Largue de ser covarde e de esperar que eu morra para me punir! 
Bundão!
Desafio-teagora! a demonstrar a força que parece ter. Que dizem que tu tens... UUUuuuU Que medinho...

Tem essa porra toda ai mesmo? 

E olha! 
Eu me entrego ... Veja só...
Eu me entrego como cobaia para que prove sua capacidade de ser mal, humano e vingativo

Vai me dizer que é de levar desaforo para casa??? - risos
Você é tão patético cara...
Tanto quanto Eu!

Provoco-te com indiferença, 
E nada me ocorreu enquanto gritava tudo isto

Se conseguires usar-me de exemplo para mim mesmo,
Sagrado para mim tú serás!

E enfim,
O meu fim trará,
Fará-me um seguidor teu. Finalmente de novo!

Criarei meu santuário,
Pregarei meu símbolo na cruz,
E condenarei-me a agradecer-lhe o tempo inteiro 

Pelo resto dos meus dias temerosos...

25.2.13

Soltamente

I.

Aqueles dias quentes sem refresco já incomodava.
A roupa colada no corpo, 
A cabeça ansiosa para antecipar o destino, 
O corpo caminhando abringando-se nas sombras.

Que calor era aquele que implorava por noite?
Qual a temperatura, que uma vez atingida,  fazia-o esquecer-se dos conflitos,
anuvia-lhe os planos, confundia-lhe as certezas, deixava-o mole? 
Nas ideias, apenas devaneios sobre alívios-corpóreos-imediatos.

Geleiras... estão quão distantes daqui?

Do Sol vinha, sentia vir, 
uma energia carregada de vigor que abriam os poros, 
uma intensidade que afogava o corpo com a própria água. Banhava-nos de nós mesmos.

Os rios; mares; águas; suores dos corpos;
Voavam as águas ao encontro do envolvente, ardente e atraente astro.

No alto o encontro pluvial. Chocavam-se sem impacto. 
Flutuavam discretas e invísiveis. 
Seu vapor pintava a tarde com uma única cor: 
Cinza-sereno

Profecia óbvia;
Já exausta de calor-lançado, despejou com ira a água absorvida,
devolvendo o que não lhe cabia mais. Chuva. 
Chora, ato quase triste pelo desapego. 

Levada pelos ventos. Permitiu por acalento desanuviar o céu.
Por detrás, risonhamente, ressurgia o astro. 

Naturalmente belo, somos natureza. Também
Contribuindo 
e recebendo semelhante parcela.


II.

O dia passa, mudam-se as cores.
Apresenta-se a noite manchando o dia com seu novo azul-claro-escurescendo

Noite clara, negra.
Por ali fica, horas-somada-de-horas que silenciam os corpos.
Com sua aúrea pesada, exige descanso.

Desta vez ele resistiu. Ficou a sós, mudo por respeito;
mudo para contemplá-la. 
Atento. Absorto. Distraído.

Do negro ao roxo. 
De súpeto: está roxo o céu?
De súbito?

Ressurgia o astro que paulatinamente manchava a noite, 
espreguiçando-se a cada raio de sol, 
o infindável ciclo degradê das cores.

Como criança espantada, encantada pela claridade, 
Ele reparava no brilho intenso que surgia, 
no velho astro que se erguia.

De suas retas sinuosas 
sentia a intensidade difusora.

Detendo a vista sobre o Sol, descansou o espírito. 
Por horas a olhá-lo, sem se desviar.

Alterou a mira dos olhos por incômodo,
por cansaço de testa franzida. 

Recebeu a força do clarão redondo.
Percebeu que mesmo sem olhá-lo 
Ali estava ele!

Encontrava-o em todos os lugares em que pairava a vista.
Até de olhos fechados, no escuro, enxergava-o.

Percebeu que o grande astro estava nele. Encrustrado em sua visão.
Era nítida a imagem do pequeno semblante, a redonda silhueta azul estava em tudo quanto era lugar.

A contemplação da grande estrela marcou-lhe a retina da memória.

O Sol se alongava pelo céu, 
sem cauda, sem rastros de seu movimento.

No topo, observando, amadurecendo, aquecendo. Irritava. 

A roupa colava no corpo, 
A cabeça ansiava para antecipar o destino.

Voltou para casa abringando-se nas sombras.

Começou um outro dia belo e sem refresco. Começou incomodado. 

18.2.13

Solo

Sementes caem
permeiam nosso solo cerebral
são engolidas pelo inconsciente
e absorvidas pelo inconsequente

Escolhemos as sementes que vão germinar?
Podemos selecionar? Ou de tudo nasce?
Do bom ao ruim,
Da peçonha ao inofensivo,
Do humano à arvore frutífera
 ?

Reféns de acontecimentos randômicos
Regemos as nossas vontades
Regamos nossa terra com uma otimista expectativa pré-existente.

Coragem cega que atrai.
Atraídos feito um caule instintivo procurando suco em seus sulcos.

Atraídos,
procuramos alma em nossas vidas.

Somos maestros de poucas notas.
Somamos o conjunto 
para compormos a sinfonia.

Estamos prontos para germinar qualquer semente

Somos aptos para originar qualquer semente

Somos úmidos, amplos
terrenos férteis.

Pele morena feito barro, 
olhos negros como a volúpia da noite.

A comunicação muda dos cheiros.
Dispersadas pelo ar
Sentidas pelo mundo.

Nossas histórias acontecendo em simultâneo.

4.2.13

Crônica - Cansou de Descanso

Cantarolando uma velha canção regional,
Balbuciando qualquer sílaba que se encaixasse naquele velho ritmo country

Saiu animado de casa

Desceu lentamente os degraus da parte de fora

Avistava a rua, ninguém nela.

Sem olhar pra baixo, descia primeiro o pé direito

E com pose de que fazia grande esforço

Levava o pé esquerdo ao encontro do outro

Descia assim, sem pressa de destino

Uma calma quase agonizante

Namorava a rua deserta. 

Nela chegou.

Fechou o portão sem ansiedade

Fitou os dois lados da rua

e virou para o que lhe parecia mais ermo

Ao se distanciar um pouco da casa, parou assustado consigo mesmo

Na frente duas crianças, de uns 12 ou 15 anos,

desciam a ladeira que se apresentava no final da rua.

Uma passou tão rapidamente que ele mal identificou o vulto

Uma voz de moleque gritava eufórica – Vou te alcançar seu peste!

E passou a segunda criança ainda mais rápido. Ambos riam, pode perceber.

Assustou-se porque percebeu um sorriso que amanhecia em suas entranhas

Aquela cena rápida passou-lhe pela vista como um dejá-vu

Voltou com passos rápidos para casa. Estava eufórico, feito uma criança de bicicleta...

Abriu o portão e deixou-o aberto, sem manquitolar apressou-se.

Passou pelo jardim como um foguete, deu a volta na casa

e entrou no porão feito um embrião.

Lá estava sua bicicleta, velha, tingida pela ferrugem. 

Seria possível consertá-la? Botá-la na ladeira e sorrir contra o vento? 

Seu desejo era tentar, ao menos tentar...

Tirou a bicicleta do canto sujo, pegou uma cadeira para alcançar um pano encima de uma das prateleiras.Lá estava outra surpresa... Outra interrupção dos segundos socou-lhe o estômago

Ressurgiu a sua frente uma pilha de lembranças 

Que sempre estivera ali, 

aguardando sua vontade de revivê-las, de revê-las.

  

Sentou-se na cadeira.

  

Uma camada de pó camuflava a sobra material de sua infância

Velhas revistas em quadrinhos 

Empoeiradas, mas conservadas pelos pláticos que as embrulhou muitos anos atrás

  

Uma sensação de felicidade o contagiou ao recuperar aquelas páginas 

Pensamentos e sensações voltavam-lhe à memória 

Molharam-lhe os cílios, mas não chorou

Esfregou a anti-palma das mãos contra os olhos e enxugou-os

  

Parou feliz e levantou a vista 

Percebeu sobre a prateleira do lado uma velha caixa em que guardava fotos de uma vida 

Aliás - de uma não - de várias vidas. 

Retirou sem cuidado alguns objetos de cima da caixa e colocou-a sobre o colo

  

Transpirou sua vida quase esquecida 

Não tinha o hábito de revisitar-se por meio de fotos 

Confiava sua vida quase integralmente à memória (que já falhava há um tempo) 

Quando lembrava das tardes vividas ao lado de sua família 

Vinha imediatamente um grande céu azul sobre sua cabeça 

Algumas falas sonoras, lembrava-se da voz de algumas pessoas, do sorriso 

De pequenos trechos de conversas que deviam ter durado horas

Recordava-se de alguns móveis, 

de pessoas sentadas em alguns cantos de memória 

E embora não se lembrasse de quase nenhum flash fotográfico, 

de quase nenhum momento em que se antepôs a uma câmera 

Encontrou fotos guardadas ali: 

Seus irmãos, pais – todos novos! 

amigos em festas de comemorar sabe-se lá o quê 

alguns estranhos registrados ao fundo - que se lembrava vagamente de ter visto

fotos desfocadas, imagens cobertas por polegares distraídos, 

fotos tiradas de surpresa – tinha ares mais naturais, menos guardem-me-para-a-posteridade 

Encontrou uma foto muito antiga de um cachorro que tivera quando criança 

todo preto com manchas brancas nas patas, vira-lata. 

Com olhar absorto fixou-se no cachorro, de súbito 

lembrou-se de um outro bixo que tivera – por que raios desejara ter domínio sobre outros animais? 

Um pequeno esquilo que a mãe lhe dera junto com uma gaiola, 

todo dia visitava o bichinho até que este adoeceu e faleceu. – sentiu-se minimamente culpado por esta morte 

mas pensou que ao longo dos anos a memória o havia absolvido, pois nunca mais lembrara desta vida que passou pela própria 

Guardou a foto na caixa.

O que o levara até o porão? Não se lembrava mais... 

Não possuía o hábito de reviver a própria vida,

de lembrar do que acabara,

do que havia acabado mas continuava em seu peito.

Ainda sentado movia os olhos emocionados

Estava tudo ali, tudo!

Suas memórias materializadas em cada canto em que batia a vista

Viu quadros que gostava

Embora não tivessem espaço do lado habitado da casa,

Achou um violão descascado e sem cordas apoiado na parede.

Nele havia feito algumas canções, julgou-as belas por um tempo

Registrara em notas-ralas e letras mal-elaboradas os amores mal sucedidos

Músicas ruins para bons amores, boas sensações...

Percebeu que havia mais da sua vida encostada num canto empoeirado

Do que na sala limpa e organizada em que passava suas recentes tardes

Lá embaixo, com seus antigos pertences

Percebeu que sua vida havia mudado,mas que ele era o mesmo

Mudanças chegam, e ficam

E as vezes param de mudar por exigência da vida

Mas ele continuava com sua jovem necessidade de sentir o novo

Controlou-a durante anos, abstendo-se.

Sentiu uma rotineira vontade de arrumar tudo o que tirara do lugar

De organizar as caixas, reencostar a cadeira, manter a ordem.

Mas não o fez.

Relembrou uma velha canção country

Que lembrava muito um ritmo regional

E cantarolou em voz berrante

Saiu do porão, tirou os sapatos

E correu descalço sobre a grama molhada do jardim

Sentia-se novo novamente,

Sentia-se ele como não sentira em anos

A vida rebatia em seu peito

Percebeu que era preciso guardar novas memórias

Porque as antigas

Já estavam empoeiradas.

FIM