23.12.14

Resposta

Drogado,
de merda. Não passa.
Realmente há coisas que não passam,
independente de intensidades, de vontades
de mim ou de você.

Merda é o corpo que fica,
decomposto, disposto
à renovação, à vida eterna.

Drogados, todos somos.
de merda, de calmantes, de crenças,
de rotinas, de segredos, de toxinas alimentares
de carga horária empregatícia,
de transtornos de humor, de ansiedade, de dinheiro.

Não passo de um zé ninguém,
de um zé alguém. Não passo, mesmo.
O que nos faz piores ou melhores? As diferenças?
Não! 
São os pontos de vistas impregnados de certezas.

O cristianismo (não Cristo!)
e seus consumidores nos definem exemplarmente há anos.
Violentos pregadores da paz.

Já percebeu a sensação boa que lhe bate
ao definir que o outro é torto, que ele está errado?

É a autoafirmação em praça pública!!!

É o soterramento da dúvida latejante 
que nos questiona como Ser.
É um pedido carente desesperado por um abraço, um consolo.
Fodam-se os questionamentos... Vamos!

Vamos seguir o rebanho
que caminha a mesma trilha há séculos.

E... se ainda não chegaram lá,
Não se teve notícias de que se chegaram lá, certo?
acredito que ainda estejam andando em círculos.

E o tal do inquisidor que não desce dos céus
para fazer justiça, para devorar os que vivem?

Para satisfazer essa vontade humana
de exterminar os diferentes,
que seguem mesmo sem consulta ou autorização divina.

Não passa... Não passo.  

Não posso. Não ultrapasso mesmo nenhum Zé,
somos mais do mesmo de uma forma ou de outra.
Fique com os seus remédios e eu fico com os meus.

Talvez não possua futuro. Mas quem é que o possui?
Quem o guarda no bolso e o relê enquanto viaja de trem?

Não posso, não possuo tamanha...

O presente é muito mais latente!
E o passado se apega ou se apaga.
Talvez seja isso outra escolha.

Agora quanto aos vícios, seus ésses raivosos
e essa minha tendência para contrariar a moral estabelecida,
não posso discordar.  Sou cheio deles.

Alguns realmente me preenchem.

Encha a boca com fumaça,
recomendo a verde ao invés da cinza,
encha com silêncio, com vida própria, com arte, com mais suspeitas que certezas.

E não abafe o som que estreita seus ouvidos.
Apesar da dificuldade, você perceberá simplicidades. 

O mundo está mais para os errantes.

8.12.14

Tapete

O contrabaixo andante ditava o ritmo.
Minhas idéias eram palavras soltas
fazendo sons no pensamento. 
Meus conflitos dançavam.
Toda ideia era calma. 

Rasga! O Sopro do mestre. Deus? 
Deu-se num Sax.
Rompendo no peito feito flecha com farpas.
Despregando as amarras. Evadindo o próprio corpo.

Olhar o nada e largar-me ocorreu numa ação dessabida. Aquele grave com som de madeira que abraçava a cintura, levava-me.
Aquela corrida de notas sopradas sem freio, sem pouso, lembrava-me tanto a vida.
Mas qual? Coltrane é de 60. 

Estou novamente atrasado.
Mas o tempo necessário foi tomado, até o último gole. 
Houve atraso, não desperdício do tempo.
Mas como explicar pra quem é regrado?

Pés descalços, 
cigarro na mão esquerda repousada sobre o cinzeiro de plástico.
Costas no tapete, olhos para o teto.
Fumaça densa subindo em ésses.

Desejo de mato, de advinhar a chuva pelo cheiro, da noite extremamente longa, desejo do silêncio com cigarras, 
desejo de um trago longo. 

Ficou sem cigarros. Correu à padaria em frente para comprá-los. Lá, 
distraiu-se rapidamente com uma televisão ligada, sorriu para a caixa e saiu. Esqueceu-se do que pensava, de concluir. Trocou de pensamento na volta pra casa. Desviou o dia.

4.12.14

Bate o pé na estrada

Bate o pé
estrada bate
Arvoçoa fragmentos
de terra
misturados com lamentos
que enterra
Poeira à beira
enquanto bate
estrada parte
no pé

Tão pouco se dá conta
que é na ponta
que o deleite se encontra

Bate o pé na estrada
rumando o horizonte fugitivo
que é caminho, é onde se está 
é o que passa, mas nunca laça 
o destino ser esquivo

Estrada bate
Nada abatido
Pé no embate

A estrada bate
enquanto passa
e ainda há muito o que passar

No calcanhar sofrido
terra batida, apanhada
contando uma história, trajetória
qual curva eu não entrei,
onde corri onde parei
terra que acolhe o passo sem amortecer
estrada que recolhe o vasto para caber
já sofri já fiz sofrer
bate o pé estrada
Estrada bate

há sempre um empate em perder