26.12.12
18.12.12
Anuir com o ano. Com o ano ir...
Quero, só por curiosidade, provar os limites do
corpo
Desgastar toda esta carcaça em discreta
descomposição
Quero esgotar todas as minhas idéias
Descartar todos os planos
Quero exaurir todo o tipo de conversa
desnecessária
Impedir o excesso de engajamento
Quero sussurrar todo tipo de besteira ao pé do
ouvido
Desabotoar toda a sua timidez
Quero grudar na sua boca e chupar todo seu mel
Desapegar desta incerta possibilidade de sofrer
Quero dividir meu corpo
Despejar minhas frações em caldeirões de tribos
canibais
Quero nadar no mar em noite de tempestade
Desanuviar meus olhos cinzas
Quero vida e quero agora
Provar d’um agora duradouro
Quero logradouros dentro de mim
Quero guardar tudo que fui esprimido num canto
Quero expandir meus tijolos, refazer a estrutura
Sou consumista,
Quero consumir vida
A minha
Gastá-la,
arrastá-la feito sandália de andarilho
Quero antecipar a morte ao intensificar os segundos,
Imortalizar cada instante vivido,
Quero envelhecer meu próprio passado
Cometer mergulho circense de grande altura, sem rede de
proteção
Quero saber pouco e sentir-me infinito.
Sentir a serenidade dum homem isolado e a euforia de um
hiperativo.
Quero ser palhaço para a criança,
Ser desorientado para o idoso.
Ser um parâmetro a não ser seguido.
10.12.12
Na Beira dum Lago
Quero a
liberdade dos pássaros
Eu aqui sentado, à beira dum lago.
Nós desejamos liberdade parecida, mas a tiramos.
Quero que minha gaiola nunca se feche,
Quero
que o mundo a sinta.
Os
pássaros sabem voar, e o fazem com naturalidade
Repousam
sobre as correntes quentes de ar, deixando-se levar
Experimentam
observar a vida sobre os galhos das árvores
E ali
ficam por um tempo que não se conta
Experimentam
trocar de árvores
e com
extrema sensibilidade percebem a
diferença entre cada uma delas
Essa
diferença é a beleza sentida por eles
A diferença entre tudo
É o que torna o Tudo belo. Misticamente belo.
A diferença entre tudo
É o que torna o Tudo belo. Misticamente belo.
Pássaros são sensíveis
Mas não possuem o domínio dos sentidos.
Pássaros são facilmente apaixonados.
Uma paixão inteligível. Forte.
Sentida em quantidade e em simultâneo.
São apaixonados pelas diferentes sombras
Amam os diferentes feixes de luz entrecortados pelas folhas,
Mas não possuem o domínio dos sentidos.
Pássaros são facilmente apaixonados.
Uma paixão inteligível. Forte.
Sentida em quantidade e em simultâneo.
São apaixonados pelas diferentes sombras
Amam os diferentes feixes de luz entrecortados pelas folhas,
Conseguem perceber os ventos que mudam de acordo com a altura
Reconhecem os variados tipos de madeira em
que se agarram,
se são
lisas, robustas ou descascadas pelo tempo.
O pássaro ama a vida, sem saber que ama.
Cantam para si e para ninguém.
Cantam para si e para ninguém.
Eu aqui sentado, à beira dum lago.
Com
tanto mundo por ai.
Eu aqui
sentado, a beira dum lago.
A
mistura dos cantos, o silêncio das águas
Ouço minha
respiração profunda e calma
Os pássaros
são exuberantes,
Voam à minha frente
Com seu canto, parecem dizer:
Com seu canto, parecem dizer:
“O mundo
não é só este que te toca os pés,
O mundo
é imenso e deve ser conhecido”
Eu aqui
sentado,
Refletindo
sobre as formas de viver
Sobre as
formas de se privar da vida
E por
estar aqui sentado, apenas pensando
Não sei
se vivo, ou se apenas penso
Ou se
penso que vivo
Mas por que me deu vontade de refletir sobre os pássaros?
Ora, sei lá. Pensamentos chegam sem aviso.
Pássaros
são livres.
Estou observando-os com estranha alegria
E neste tempo todo
Não pude identificar o limite que os prendem
Estou observando-os com estranha alegria
E neste tempo todo
Não pude identificar o limite que os prendem
Nós desejamos liberdade parecida, mas a tiramos.
Tiranos tiramos.
Quando
encontramos algo belo, como os pássaros
Desejamos,
com imenso egoísmo, aprisionar esta beleza
Vê-la
todos os dias, senti-la todos os dias
Amamos possessivamente,
Um desejo soberano, injusto e cruel
Um desejo soberano, injusto e cruel
Queremos
voar, mas também prender
Queremos
voar, mas também ser preso
A
beleza, ainda que engaiolada, permanecerá bela.
Mas não do
ponto de vista de dentro da gaiola,
Onde se
vê o mundo de fora idêntico ao que se vivia,
Onde se ouvem
os pássaros com cantos eufóricos e livres
Onde se
percebe as árvores, galhos e sombras.
Onde se
enxerga a vida e encerra-se a própria.
A beleza
está lá, intacta, presa.
Pássaros
são condenados por terem nascidos belos.
Esta é a
sua culpa. Nasceram belos e livres.
Privar
algo belo apenas por querer garantir que esta beleza seja sua
É privar
o mundo de conhecer algo
que reconhecemos como belo
que reconhecemos como belo
É privar
esta beleza
de conhecer outras belezas
de conhecer outras belezas
Queremos
ser únicos... E somos. Esta é a nossa maldição (ou salvação)
Pois queremos
ser completos e completar
Ser
único é ser limitado, pois não possuímos todas as qualidades procuradas
Existem
lacunas
que não
precisam de um preenchimento pleno
Mas uma
vida completa e recheada de todas as satisfações é algo tentador
Como
exigir que um pássaro, belo, vivo, com um canto alegre
Reproduza
tal canto e vivacidade num espaço limitado?
E nem
que esse espaço aumente. O nosso limite deve ser o mundo.
Apesar
da natural vontade (humana) tirana
De
querer reter uma beleza
E querer
ser retido;
Exercito
uma contra-vontade.
Impor-se
como único, é impor limites.
Limites
são gaiolas que consomem vida
Exercito,
mas não posso evitar-me.
Sou
daqueles que possuem gaiola e gasto tempo ornamentando-a.
Mas não
faço dela moradia forçada
Quero
que minha gaiola não limite, deixo-a sempre aberta
Para que
pássaros vejam o mundo de fora e não se sintam fora dele
Quero que minha gaiola nunca se feche,
E mesmo
que as vezes eu finja que perdi a chave,
Deixo-a
escancarada mais cedo ou mais tarde.
A beleza
dos pássaros é a liberdade
Quero
vê-los voando e pousando sempre
Sou
contra a adição de gaiolas.
Sou a
contradição.
5.12.12
A Travessa
Os carros disputavam espaço, arrancavam.
A beleza despretensiosa é ainda mais bela.
Arrancavam a paz com o atropelo dos sons
futuristas
Mas por um momento a cidade suspendeu...
Os carros em consenso, brecaram para dar passagem à moça
que esperava o sinal vermelho para atravessar
Aguardaram-na com satisfeita paciência
Os carros em consenso, brecaram para dar passagem à moça
que esperava o sinal vermelho para atravessar
Aguardaram-na com satisfeita paciência
Foi com deleite que acompanharam o desfile que se
inciava à frente
A beleza despretensiosa é ainda mais bela.
O sorveteiro que atendia a criança distraiu-se,
e deu o troco sem ter certeza do valor que
devolvia
O homem de terno ao celular desconsiderou a
importante ligação
E deteve-se para observar a aproximação de
descomunal beleza
Por conta dela...
O sol ressaltou e alaranjou ainda mais o passeio
O vento soprou suave e rápido para contornar as
curvas da pequena moça
O céu desanuviou dando um largo sorriso na tentativa de ser percebido
Um casal de apaixonados que se beijavam,
pararam
E depois beijaram-se com ainda mais vontade,
pois desprezar o que todos viam
fez-se necessário para não desgastar a relação
O tempo se desapressou, os pássaros cantavam
esgoelantes
As cores tornaram-se vibrantes
O decorrer do dia foi esquecido durante aqueles
imensos instantes
Os transeuntes desistiram do trajeto, viraram
espectadores;
O Padre não pode evitar a curiosidade e também
olhou
Todos olharam
Os passos se encurtavam e quase pausavam o
caminhar;
Os corpos que haviam ultrapassado o ângulo de
visão, torciam o pescoço para trás;
Ninguém queria perdê-la de vista
Olhos vidrantes apenas para vê-la atravessar
Um evento habitual, mas que nem sempre contém
tamanha abundância
Uma beleza feito um quadro, quase congelada
durante alguns segundos
A beleza dela se multiplicava e distribuía-se a
cada observador
Eis que ela completa a travessia. E o mundo
pode então voltar a si.
E Ela tão bela, não soube.
Não sei se por descrédito, hábito ou
desconfiança
Desprezou o mundo que a contemplava
Chegou ao outro lado da rua impecável e
exuberante
Tão despreocupada com o caos que causa
Quanto indiferente ao que por ela pausa
Assinar:
Postagens (Atom)