23.6.15

Estou bem, e você?

E se resolvesse assumir-me para o mundo,
ser militante de mim, afrontar?

Cansei de fingir não ser doente, não sermos todos.

A todo tempo nos perguntam: “Você está bem?”.
Pergunta vazia, nós bem sabemos, apesar de carinhosa algumas vezes.
Como respondê-la, 
assumir que estar bem é consentir com o mundo?

Portanto não estou bem, 
com essas as pessoas que nos cercam,
mantenedoras da ordem, alguns mantenedores fervorosos. 
Uma ordem em constante mudança
e em constante conservação das recentes conquistas. 
Seja pelo uso da força e violência justificada
ou pela opressão silenciosa e histórica
,algo é mantido. Por uma multidão.

Que estranho é vestir-se todo de amarelo entremeio um amontoado de pessoas vestidas de azul.
Imagine mesmo!! 
A imagem é pobre, eu sei, mas imagine-se sobre uma colina, em qualquer parte dela,
com muitos ao seu redor, todos vestidos de um azul-marinho único e você todo de amarelo.
O que faria? Teria que fazer algo certo?

Estranho sentir essa necessidade de manifestar ação
perante a uma percepção do que o todo coletivo faz. 
Há uma força sugestiva. Pesada, que resiste à vontade de viver.

Uma etiqueta de comportamento; de fisionomia; de corpos modelados e parecidos;
de talheres sobre a mesa, gostos sem texturas;

o saciamento causado pela bajulação do ego; a negação da morte;
o culto da alma em demérito do corpo; o ódio ao prazer;
a liberação, aos poucos, do que se permite fazer sexualmente;

as vidas inscritas nos livros; a arte como decoração;
uma vida virtual incrivelmente feliz; o corte de cabelo;
o não conhecimento das pessoas que moram no seu quarteirão,
na sua rua, no mesmo prédio;
o bom-dia dito numa espécie de oi matinal;
o “fica com Deus” ser recebido como um abraço;

o uso de roupas, com a finalidade de esquentar e proteger quase esquecidas;
a domesticação e o excedente necessário de carnes no mercado; 
os tributos; a família; os feriados;

os empregos;
as saídas de sexta-feira a noite; as dormidas no domingo;
os sete dias da semana ao invés de dez com três semanas no lugar de quatro, os doze meses.

o reconhecimento imediato de riquezas;

Empenhos por recompensas;
a entrega de frações de vida a seres mitológicos;
a fome prática, que alimentada diariamente, sustenta uma alta movimentação monetária
na qual não participa;

a necessidade de termos tutores;

São vontades e preocupações extra corpo, fora do material.
São concessões diárias que fazemos sem perceber. Ou mesmo que se percebam algumas,
ainda estaremos cedendo em partes encobertas. São tantas.
E mesmo que se quebre uma ordem, faremos outro pro lugar. Mas não importa.
Desde que se mude os aspectos que nos cerceiam.

E se resolvêssemos afrontar o mundo?
Mesmo que seja de uma maneira prática e individual.
E se resolvesse assumir-se para o mundo, ser militante de si?
Que mundo teríamos?
Manteria muita coisa? Experimentaria?

Talvez esteja ansioso
para viver hoje um mundo que não será hoje.

São muitas as pessoas alheias à manutenção da ordem e do progresso
e que a sustentam. 
E de uma maneira que só se lembram das dores ocasionalmente.

Permito ficar bem sem consentir com o mundo,
sem estar bem,
viver apenas o que está ao alcance das horas
e abstrair-me da resistência ao novo.

Mas antecipar a história
é tentativa abandonada que me corrói por dentro.



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